Paula Rego/Josefa d'Óbidos: arte religiosa no
feminino
19 de Dezembro de 2020 a 19 de Setembro de
2021
Curadoria: Catarina Alfaro
A programação da Casa das Histórias Paula Rego tem vindo a ser
definida em função da premissa de que a obra da artista comunica
com o tempo passado e com o presente, e constitui-se também como
elemento diluidor das hierarquias e de diferenciação entre a arte
erudita e a popular, arte contemporânea, artistas consagrados,
artistas outsiders e outras possíveis diferenciações que
habitualmente espartilham o território das artes visuais e os seus
produtores.
Na genealogia artística feminina e na respetiva análise
historiográfica da arte portuguesa destacam-se dois nomes separados
por quase três séculos: Josefa de Ayala (1630) e Paula Rego (1935).
Trazer para este museu monográfico duas exposições de duas mulheres
artistas, com um título comum, mas assumidamente diferenciadas no
espaço - a exposição de obras de Paula Rego decorre em sete salas
contíguas e a de Josefa na sala dedicada a exposições temporárias -
justifica-se, desde logo, pelo modo ambas se distinguem, nas suas
diferentes épocas criativas, pela originalidade da sua obra que
ultrapassa os academismos dominantes nas suas épocas, pela intensa
carga sensualista que ambas imprimem à pintura e ainda pela
capacidade imaginativa de reconfiguração das temáticas religiosas,
utilizando um discurso original, estruturado e proferido no
feminino, em que o sagrado e o profano comunicam através de um
vocabulário pictórico pessoal que ambas ousaram construir.
Afastando qualquer intenção comparatista entre as suas vidas e
obras, é inevitável estabelecer pontos comuns. O carácter
independente e o empenho na afirmação da sua individualidade, quer
na vida, quer na arte, foram certamente determinantes para a
realização de um percurso artístico único.
A escolha de temáticas religiosas em que as mulheres são
protagonistas, ou modelos femininos exemplares, poderá igualmente
funcionar como um critério de aproximação das duas artistas, até
porque ambas coincidem, mais do que uma vez, nas suas escolhas
quando representam "heroínas cristãs".
A seleção de obras de Paula Rego para esta exposição foi feita a
partir de uma temática comum que a artista explorou, de modo mais
ou menos declarado, desde sempre: a religiosidade católica e o que
ela encerra de misterioso. E a sua reflexão constante sobre o
protagonismo das mulheres estende-se assim a personagens concretas,
santas e mártires, detentoras de uma existência narrativa e
histórica.
Josefa de Ayala estende a sua representação de modelos femininos
da Igreja Católica a uma personalidade marcante, sobretudo na
Península Ibérica, pelo seu papel reformador na definição da
espiritualidade do século XVI em diante. Esta mulher, Santa Teresa
de Ávila, de invencível sentido crítico foi freira, escritora,
reformadora, fundadora, proeminente mística espanhola, e nasceu em
Ávila em 1515. De todas as encomendas aceites por Josefa para
pinturas de retábulos de diversas igrejas portuguesas destaca-se,
pela sua qualidade de conjunto, a série de Santa Teresa do Convento
de Nossa Senhora da Piedade, de Cascais, datada de 1672, e que se
constituiu como núcleo fundamental para a seleção de obras da
artista nesta exposição.
São apresentadas 115 obras de Paula Rego explorando diferentes
técnicas (pintura, desenho, gravura, escultura) e 21 pinturas de
Josefa de Ayala.